Cadê meus óculos?
Lá vão as irmãs fazer um curso juntas,
Duas delas. Ao todo são cinco.
São unidas, são mesmo companheiras.
Estão envelhecendo, bem sabem, e não podem mais sem óculos de grau.
Os dias foram bons, quentes, divertidos. Aula de dia, uma cervejinha a noite no bar em frente ao hotel, risadas, fofocas, cumplicidade, coisa de irmã.
Mas na hora de ir embora é que a coisa parece desandar.
- Iracema, cadê meus óculos?
- Não vi, Lora.
- Estavam aqui no criado mudo.
- Espia debaixo da cama, vai ver caíram.
- Já olhei.
- E no armário do banheiro, junto com as escovas de dentes?
- Também já olhei.
O telefone toca, Iracema atende e se volta para a irmã, aflita:
- O taxi já chegou, e agora?
- Preciso achar meus óculos, não posso ir embora sem eles.
- Você já está toda empolada com essa afobação.
- Vamos procurar, me ajuda!
E as duas reviram tudo, olham embaixo do colchão, dentro das malas, das bolsas, atrás do vidro de xampu e até dentro da lixeira do banheiro.
- Seus óculos não estão no quarto!
O telefone toca outra vez:
- Olha, moça, fala pra ele esperar só mais dois minutos, por favor, nós já vamos descer, é porque perdi meus óculos.
- E agora, Lora?
- E agora é ir embora sem os óculos, ué. Já reviramos tudo, devo ter esquecido esses óculos lá no curso, ou no restaurante ontem a noite.
- Ô Jesus! E agora?
- Pois é, custaram tão caro! Ainda estou pagando por eles, que raiva perder meus óculos! Mas não tem jeito, então vamos descer senão o homem vai embora.
Lá foram as duas carregando as malas pelas escadas do modesto hotel, trombando com as paredes e tropeçando nas próprias pernas por causa do pequeno espaço entre os degraus.
- Para a rodoviária, seu moço!
- Tem certeza que você trouxe os óculos? Não prestei atenção se você estava com eles.
- Eita, claro que trouxe, não consigo enxergar sem eles. Lembra que ontem a noite eu até lhe emprestei para você ler seu livro?
- É mesmo, que cabeça a minha! - respondeu Iracema levando a mão à testa.
- Iracema...
- Pois é...
As duas caem na gargalhada.
- Estavam o tempo inteiro na minha cara, né?
Cyntia Pinheiro
Enviado por Cyntia Pinheiro em 14/08/2021