Havia brincos de uva adornando o jirau
Enfeitando as orelhas, colorindo as línguas;
Festa de fogueira, pulada e cismada
Pegando comadre, sobre as batatas-doces;

Havia enxurrada nos cantos da rua
E meninos pés-roxos chutando alegrias;
Também se ouvia o tremelicar dos leques
Das palmeiras vestidas de sabiás;

Chuva sangrando pipas
Relâmpagos rasgando a barriga do dia
O cheiro do café no coador de pano
A dança das formigas fugitivas

As galinhas acaipiradas no poleiro
E os ciscos barrentos de folha caída
Farelos de milho ensopados
O papa na TV dando a reza

E os 'cruzes credos' nas bocas
Olhando o cururu na soleira
A cretinice dos grilos anoitecidos
E os 'benza Deus " pelas testas.

O cheiro de mato molhado
O buriti na cestinha de palha
A sopa sendo engrossada
E a saliva chupada língua a dentro

Anoitece e amanhece num cuco
E o badalar de hora em hora
Nem desperta, nem desgosta
É um sonho enferrujado de ponteiros

O dia esqueceu-se da borrasca
O sol caiu no chão amarelado
As frieiras nos pés dos meninos
O chá quente pra espantar resfriado

O colo de mãe mais que mundo
O biscoito cheirando no forno
A vida beirando a alegria
Um passarinho aninhado na paz.