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Cyntia Pinheiro
Uma mulher subiu na mesa do bar e fez da saia um disco voador
Textos
Silêncio, uma utopia.
Quero um pacto com o silêncio
E  vou inventar o novíssimo e revolucionário
- antiruidômetrosintomáticoperiféricocataclismático -
Um aparelho anti barulho que vai calar o mundo
Sempre quando eu precisar de paz.
Eu tenho necessitado de silêncio,
Mas não o acho.
Ficou caro. Ficou raro.
A oferta é pouca, a procura é muita.
E já não se acha em prateleiras de mercado.
O silêncio de quando tudo começou
Faz falta. Não existe por essas bandas.
Aliás, banda nenhuma toca em silêncio.
Vou inventar a revolucionária banda
- silenciosamenteruidosacautelosaemelismática-
Seu sintetizador vai cobrir todo o barulho
com o magistral não-som!
Olha que beleza!
Por mais que vocalistas cabeludos
Quebrem os pescoços sacudindo
E berrando ao microfone,
A fabulosa sonorização
Capta o som e o transforma no mais deleitável
SILÊNCIO!
Por quê? Porque o silêncio virou uma utopia,
E uma loucura.
Já imagino coisas impossíveis e formidáveis.
Quem me dera poder agora desfrutar
Do único som que me interessa no momento:
O "ploc" de uma uva se rompendo
Ao contato com meus dentes,
Sem sujidade nenhuma, sem interferência
De panelas chiando, martelos batendo
ou carros buzinando na rua.
Eu queria poder degustar um som gastronômico
- Essencialmente e saborosamente -
E para isso só vejo uma saída:
Vou inventar o mais que revolucionário
- aparelhoselecionadordesonsagradáveisaopaladar -
Para poder ouvir só o que eu quero,
Inclusive fugir das fofocas,
Das maldades e só escutar coisas deleitáveis.
Ah! E comer ouvindo as pequenas explosões
Em minha própria boca.
Pois é, o silêncio ficou raro
E ficou difícil higienizar nosso ambiente sonoro.
Ouvir o que a gente gostaria
É um privilégio para poucos.
Não ouvir nada, é raridade que vale quilos de ouro,
E eu pagaria se pudesse.
Mas aí teria que inventar a revolucionária
- maquinafazedoradeouroparacomprarosilêncio -
Já deu, né?
Navegar em ondas sonoras sem nenhum crítério
Dá nisso...
A gente fica meio acelerado,
E meio ranzinza.
Quando não naufraga e é engolido
Por um mar de notas.
No meu caso, emito uma:
Dó!
Porque tenho pena.
Cyntia Pinheiro
Enviado por Cyntia Pinheiro em 18/06/2024
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